quarta-feira, 12 de maio de 2010

Como será que me vêem? Marco Aur


Marco (Aur) Aurélio C. de Souza
Coordenador educativo e professor de música nas Obras Educativas Padre Giussani

Hoje vou me referenciar muitas vezes em um artigo escrito por uma palhaça. É a Dra. Ferrara (Thaís Ferrara – besteirologista dos Doutores da Alegria).
Ela escreveu um artigo muito interessante sobre os 18 anos do seu grupo de palhaços doutores, em que faz referencia a Mafalda. Vai aí o primeiro trecho:
Um dia perguntaram a Julio Cortázar, escritor argentino, mestre do conto curto e da prosa poética, o que ele achava da Mafalda, personagem de histórias em quadrinhos criado por Quino, também argentino. E ele respondeu algo como: “o importante não é o que eu penso da Mafalda, mas o que a Mafalda pensa de mim”.

Com um frio na espinha, comecei a moer, ruminar como um mamífero pensante essas palavras. -- Como essa frase é curiosa! Lembrei-me imediatamente do Daniel, menino pequeno, que deve ter seus 3 anos e que acabo de conhecer. Ops: talvez seja melhor dizer que ele acaba de conhecer-me. Sim, pois como diz a Dra. Ferrara:

Elas (as crianças) têm uma percepção muito particular, originalíssima, vêem o mundo por ângulos peculiares, abusam do que não é usual.

E era, eu era o diferente, eu era o invasor do seu espaço, era o professor de música que acabara de chegar ali sem aviso, com uma bolsa cheia de coisas desconhecidas que faziam ruídos nem sempre muito agradáveis, com propostas estranhas de dar as mãos e dar uma rodadinha, com um aspecto estranho, barba...

As crianças vêem o mundo a partir do seu tamanho. Devem achar estranhas as bochechas dos adultos penduradas quando olham de baixo para cima.

– Com quê deve parecer essa pessoa? -- Imagino que ele deve ter pensado.
– Com o meu pai certamente não! Será que eu estou gostando disso tudo? -- Poderia pensar.
E ele era o único ali que tinha a fronte cheia de dobrinhas, testa franzida, certamente preocupado com aquilo tudo.

A despeito do que estava acontecendo entre mim e o Daniel a aula transcorria maravilhosamente, com uma adesão admirável, uma leveza favorecida pela alegria do primeiro dia de aula e do ventinho e sombra boa. Ao final da aula, parodiando o Antonio Abujamra – em uma entrevista – disse à criançada: -- a aula acabou, cascar o fora, pica a mula, dá no pé!! Entre risos e muita marotice ninguém saía do lugar. Resgatei o violão e cantamos várias músicas que eles já sabiam. Aí anunciei que ia pegar a surpresinha. Corri até a minha bolsa e trouxe pra mostrar pra eles um bicho dentro de uma maleta... foi quando fitei o Daniel... ele tinha pego a isca. Ele era meu neste instante, e eu aproveitei...

Quando os palhaços colocam a cabeça pra dentro do quarto (no hospital), e pedem permissão para entrar, já da porta identificamos ações milimétricas na criança.
(...) É uma aula viva para qualquer palhaço: sinais econômicos, contundentes e muito generosos, pois nos dão a pista para chegarmos a elas.

Foi aí que tive coragem de me aproximar, de mansinho, e de um jeito muito exclusivo permitir que ele visse de perto o grilo que estava lá dentro da maleta. Ele se abriu, sorriu, me enxergou companheiro, talvez tenha até se esquecido do seu porto seguro – a educadora que estava ali a seu lado --, quem sabe até mergulhado no instante presente como todas as crianças, sem suplicar pela visão da mãe que demorava a chegar.

O grilo pulou entre nós, fez uma festa danada! E me despedi como sempre fiz durante todos os anos: -- Um beijo e um pedaço de queijo!
Ninguém foi embora!! Rss

Obs: o artigo da palhaça Ferrara é melhor que o meu:
http://www.doutoresdaalegria.com.br/download/balanco2009_baixa.pdf

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